Notas de gin em uma noite solitária

Foto: Toni Cuenca


— Gin. Por favor.


— Puro?


— Sim. Duplo.


O barman simpático me entregou um copo longo pela metade.


— Você está bem? – Perguntou ele por nada.


— Uhum – respondi seca.


Imediatamente senti que fui meio grosseira e me arrependi. Talvez ele só tivesse achado estranho uma mulher sozinha sentada no balcão de um bar de uma balada vazia virando a terceira dose de gin na noite de Natal. Nada estranho.


— Meus amigos estão lá embaixo, na pista. Não tô a fim de dançar.


— Também não gosto desse deejay.


— Eu não disse que não gosto do deejay.


— Desculpe.


— Não gosto. Relaxa, só quis te constranger.


Ele riu.


Aquela véspera de Natal estava sendo a mais deprimente da minha vida: longe da minha família, em uma cidade não muito conhecida e um pouco hostil, com amigos recém-feitos.


— Você não é daqui, né? – perguntou ele.


— Não. Como você sabe?


— O sotaque. Por que gin?


— Mais uma – pedi.


Ele virou, deu um passo e voltou com a garrafa. E um copo extra. Serviu os dois, entregou o meu, pegou o segundo, brindou e largou no balcão.


— É esse amargo do zimbro. Sei lá. Não tem motivo, só gosto. Quando eu era jovem...


— Você é jovem!


— Quantos anos acha que tenho?


— Uns vinte e cinco?


— Trinta. Enfim, eu só bebia gin tônica. Todo mundo bebia. Depois não se bebia mais. Engraçado, né? Até bebida tem moda.


— Ainda bem que você não pediu tônica, porque não tem.


— Imaginei.


— O que você faz da vida?


— Sou...


Antes que eu respondesse, minha atenção foi desviada pelo meu nome gritado por uma amiga bêbada. Ela se pendurou em mim, quase me derrubando.


— Vamos lá dançar! O que você tá fazendo aqui sozinha? Que é isso que você tá bebendo?


— Gin.


— Blerg! Bebida de velho! Que cena! Você aqui sozinha bebendo gin. Gin! – Falava enquanto tinha um ataque de riso bêbado.


— Daqui a pouco eu desço – disse sem a menor intenção de descer. – Vou terminar essa dose.


“Com meu novo amigo barman simpático e gato”, pensei.


Mas não deu tempo. Antes que ela sumisse da minha vista, o resto da galera apareceu. Inclusive meu namorado.


Me despedi do barman, paguei a comanda e fui embora. Nunca soube seu nome nem ele o meu. Assim foi meu primeiro Natal em terras distantes.

 

Agora, dez anos depois, sentada em outro balcão, tento pacientemente convencer o barman desta balada lotada que só quero um gin tônica. Sem frutas nem especiarias nem coisa nenhuma. Pode deixar as sementes de zimbro. A moda voltou, mas veio gourmetizada.

 

Dessa vez, estou velha mesmo.



Esta história é fictícia. Qualquer semelhança terá sido mera coincidência não intencional.


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